Meus isquiotibiais pareciam feitos de aço. Ainda assim, minha alma teimosa escolhia paschimottanasana (postura da pinça) como postura preferida.
Tive então um sonho, daqueles muito vividos que não se esquece jamais. Nele, meu corpo cedia primorosamente, abdome e peito tocavam as coxas, o queixo se aninhava nos joelhos sem nenhum esforço, os braços descansavam serenamente no chão, as mãos seguravam os pés sem tensão e eu respirava tranquilamente ao mesmo tempo que uma paz imensa e prazerosa invadia o meu coração.
Acordei extasiada pelo potencial de paz anunciado naquela visão.
Sonhos muito intensos perduram na alma, e fui levada a encara-lo como premonição: acreditei que algum dia chegaria exatamente a esse estado e assim continuei caminhando.
A medida que o sonho perdia força, eu mergulhava em um paciente aprendizado de reconexão à Fonte, com muitos tropeços, bons e maus momentos, dúvidas e questionamentos, progressos e retrocessos. A rigidez parecia instalada inabalavelmente no meu corpo, ao passo que os ensinamentos recebidos - e foram muitos os mestres - começavam a levar luz ao meu pensamento e às minhas atitudes. E nesse processo surgiram ocasiões em que, em um vislumbre, fui capaz de compreender que era preciso agarrar o momento presente, que é eterno, para dele extrair a potencia de novos caminhos.
Compreendi que era minha alma que resistia e que se fechava. A visão daquele sonho nunca me abandonou, porem esmaeceu; não lhe dei mais muita atenção.
Não sei mais como e quando; foi um dia desses: paschimottanasana deixou de ser um desafio para tornar-se um dos melhores momentos do meu cotidiano.
O corpo cedeu. Mesmo uma pratica breve invariavelmente inclui a postura que ressuscitou o sonho de paz.
Descubro e redescubro, em um obstinado exercício diário que estar inserido no AQUI E AGORA é a chave para o acesso ao Todo do qual somos, cada um de nós, uma partícula. Essa inserção nos lança, por brevíssimo instantes, para fora da dimensão espaço e tempo, e ali, em um relance, compreendemos o que pode vir a tonar-se genuína compaixão, e também o que os velhos gregos chamavam de saúde: o equilibro entre o sentir-se bem e o abrir-se para o mundo exterior.
Como dizem os budistas: QUE TODOS OS SERES SEJAM FELIZES.